Diretor executivo do SNS admite fusão de urgências na Margem Sul para enfrentar falta de médicos
Álvaro Almeida, diretor executivo do Serviço Nacional de Saúde (SNS), admitiu que a concentração de serviços de urgência na Península de Setúbal poderá ser inevitável durante o Verão, face à persistente escassez de médicos nas áreas de ginecologia/obstetrícia. “Se não houver outra solução, a concentração de serviços terá de ser uma resposta”, afirmou, na sua primeira grande entrevista desde que assumiu funções, concedida ao Público e à Rádio Renascença.
A situação nas urgências obstétricas da Margem Sul é considerada “uma das mais complicadas” a nível nacional, envolvendo as unidades de Almada, Barreiro e Setúbal. Apesar do acompanhamento constante da Direção Executiva do SNS, Álvaro Almeida reconhece que não foi possível, até ao momento, encontrar uma solução consensual entre as três equipas envolvidas. “Há três meses que temos reuniões sistemáticas com as três unidades. Até agora, ainda não encontrámos uma solução definitiva”, explicou, garantindo, contudo, que “as mães da Península de Setúbal vão ter uma resposta durante o Verão”.
Segundo o Plano de Verão, o encerramento de urgências só pode ocorrer com autorização da Direção Executiva, após justificação da respetiva Unidade Local de Saúde (ULS). Ainda assim, Almeida admite que as escalas para os próximos meses, apesar de já estarem delineadas, não estão totalmente preenchidas devido à falta de recursos humanos. “A nossa prioridade é garantir que, em cada região, existe uma resposta contínua para cada tipo de urgência”, reforçou.
A escassez de profissionais médicos é apontada como o principal entrave ao funcionamento pleno das urgências, particularmente em obstetrícia e pediatria. A Direção Executiva reconhece que as três principais soluções para este problema — formação de novos médicos, atração de profissionais estrangeiros e racionalização de recursos — têm limitações. A formação “demora anos”, Portugal “não tem sido atrativo” para médicos estrangeiros, e resta, por isso, a opção de “racionalizar recursos”, o que pode passar pela concentração de serviços.
A entrevista abordou ainda o novo modelo de gestão do acesso às cirurgias, que pretende combater fragilidades identificadas no atual sistema SIGIC. Entre as medidas previstas estão a prioridade aos doentes com mais tempo em lista de espera, a antecipação da participação de outras unidades no tratamento desses doentes e a revisão dos preços pagos por cirurgia. “Há cirurgias que estão a ser pagas por valores que não correspondem à sua complexidade e morosidade”, referiu o responsável, apontando para a necessidade urgente de atualizar o algoritmo de cálculo, que data de 2013.
Sobre os recursos humanos, Álvaro Almeida sublinhou que o SNS “contrata todos os médicos que pretendam trabalhar” e que o mesmo se aplica atualmente aos enfermeiros, embora a carência neste grupo profissional continue a ser problemática, nomeadamente em serviços de internamento. “Temos poucos enfermeiros, formamos poucos e muitos emigram”, disse, reconhecendo que é difícil competir com os salários oferecidos por países como a Noruega ou o Reino Unido.
Questionado sobre o impacto da anunciada conversão de cinco ULS em parcerias público-privadas (PPP), o diretor executivo considera que não agrava o problema, uma vez que estas unidades continuarão integradas no SNS. Álvaro Almeida defende que a coexistência de modelos diferentes pode até ser benéfica: “A diversidade, para mim, é uma vantagem”, afirmou, salientando que as PPP anteriores demonstraram ser mais económicas para o Estado sem prejuízo da qualidade dos cuidados.
No que toca ao Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), especialmente na área dos cuidados paliativos, o responsável reconhece atrasos, mas acredita que as metas ainda podem ser cumpridas. Apesar das críticas, recusa rever prioritariamente o plano estratégico para esta área: “Há muitas outras áreas que não estão a resultar e, neste momento, a nossa prioridade são outras”, justificou, referindo como exemplo a reforma do SIGIC e da rede de urgências.